quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

A Desfaçatez dos Velhos Democratas

  La fuite ne sert à rien, disait l'écrivain Paul Nizan. Je reste. Si je me bats, la peur s'évanouit. » Aujourd'hui, se battre commence par ne pas détourner son regard sur l'origine du mal. Est-ce si difficile ? (Serge Raffi no Le Point Politique de 14.10.24)


Interessante como os ventos que balançam a democracia demovem as máscaras dos tiranos e daqueles que o seriam, se pudessem.


Depois de o sacarem da cadeia, com uma manobra jurídica que faria corar até o mais desavergonhado magistrado da Venezuela, os atuais ministros do Supremo Tribunal Federal reabilitarem-no politicamente, venderem a ideia de que só e somente ele poderia combater o imaginado golpe antidemocrático tramado sabe-se lá por quem, e conduziram Lula à presidência da República, tal qual Virgílio havia feito com Dante, retirando-o do Inferno e pondo-o nos braços de Beatriz para que alcançasse o paraíso! É bem verdade que, no caso de Lula, a Beatriz que o recebeu não é lá grande coisa, mas Janja não é problema nosso, ou não deveria sê-lo!


A democracia brasileira estaria salva, portanto. Com Lula! Justamente aquele que havia comprado apoio parlamentar com dinheiro desviado dos Correios, da Petrobras e etc.


Como se fossem poucas as decisões com as quais o Supremo desafiou a ordem jurídica para alcançar tal intento de resgatar a democracia brasileira, tomando-a para si como se refém dele fosse, sobrevieram as escandalosas mensagens trocadas pelo WhatsApp por assessores de seus ministros, conversas nas quais se viram claramente os métodos usados para impor aos brasileiros descontentes a mais descarada censura por meio de interpretações criativas e inventivas da lei.


Sobre o teor dessas mensagens, reveladas a conta-gotas pela Folha de São Paulo, jornal que até ontem era o aliado de primeira hora do Supremo, as conclusões das pessoas sãs dirigiram-se à estupefação!


Essas mensagens não causaram qualquer escândalo, no entanto. Para escandalizar os brasileiros atualmente, não se sabe mais o que seria necessário. Prisão de parlamentares e generais, censura prévia, julgamentos de pessoas comuns pelo Supremo Tribunal Federal, absolutamente incompetente para fazê-lo, penas absurdas impostas a quem participou do quebra-quebra do dia 08 de janeiro, inquéritos intermináveis com objeto indefinido. Tudo isso parece não ruborizar mais ninguém!


De fato, além de não incomodar os brasileiros comuns, já acostumados que estamos ao descalabro puro e simples, há algo pior: existem aqueles que defendem o atual estado de coisas. Mesmo depois de todas as revelações, de todos os abusos, do descaramento desavergonhado das decisões sem qualquer respaldo legal, das declarações feitas por seus Ministros dentro e fora de suas dependências, existe quem ainda seja capaz de justificar o injustificável caminho trilhado pelos Supremo, estreita viela pela qual somos guiados em direção ao abismo da ditadura do Judiciário.

Causando até um enojado enjoo, esses defensores do Supremo são os outrora democratas, aqueles que assinaram cartinhas e tudo o mais, os mesmos que hoje se calam diante do descalabro  jurídico que se desnuda calmamente diante dos olhos.


Sobre esses tais, não haveria muito o que falar. Ou perderam a sanidade ou encheram os bolsos com os cobres retirados da patuleia. Só que agora foram desmascarados, definitivamente desmascarados porque a rota máscara da democracia caiu de suas faces, as quais, deformadas que estão como o rosto de Dorian Gray, não mais poderão ser ocultadas pela desvelada hipocrisia de ontem!

quarta-feira, 3 de abril de 2024

Caso Marielle Franco: Incompetência Absoluta do STF

Remarquem-se algumas datas, porque elas são muito importantes para que se compreenda o sentido do texto: (i) o assassinato de Marielle Franco ocorreu no dia 14 de março de 2018; (ii) Chiquinho Brazão veio a ser diplomado deputado federal pelo Rio de Janeiro no dia 18 de dezembro de 2018.


E por que essas datas são importantes?


O Supremo Tribunal Federal, em questão de ordem na Ação Penal 937, decidiu que a prerrogativa de foro se limita aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele!


Ou, nas palavras do Min. Luís Roberto Barroso:


“Para assegurar que a prerrogativa de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das funções – e não ao fim ilegítimo de assegurar impunidade – é indispensável que haja relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo.”


Ocorre que, no caso de Chiquinho Brazão, nem em hipótese seria possível conceber que o assassinato de Marielle Franco pudesse relacionar-se ao exercício do mandato parlamentar outorgado a Chiquinho Brazão pelo povo do Rio de Janeiro, uma vez que a trágica morte dela se dera antes de Chiquinho Brazão ser eleito e diplomado deputado federal! Ao tempo do crime, ele exercia o mandato de vereador na cidade do Rio de Janeiro!


Para tornar as coisas mais claras: o Supremo Tribunal Federal só poderia julgar o caso se existisse um liame entre o assassinato de Marielle Franco e o exercício do mandato de deputado federal de Chiquinho Brazão! E isso consoante a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, de acordo com a qual, repita-se, seria essa Corte incompetente para julgar processos em que deputados federais e senadores fossem acusados de crimes comuns sem relação com o exercício de seus mandatos.


Como não há tal ligação, nem hipoteticamente se poderia imaginá-la, porque o assassinato de Marielle Franco se dera antes mesmo de Chiquinho Brazão ser eleito deputado federal, resta mais uma vez indagar se o Supremo Tribunal Federal alterará seu entendimento para desdizer o que disse no julgamento da questão de ordem na Ação Penal 937 para todos os vindouros processos ou só desta vez; se esse episódio se trata de só mais uma exceção dentre tantas que vêm tornando o regime jurídico brasileiro num regime de… exceção!