Na esquina da Rua Rui Barbosa com a Av. Mato Grosso, um dos
locais mais movimentados de Campo Grande, um povo estranho entoava cânticos
numa língua morta, desconhecida. Portavam ramos e seguiam um sujeito
com capa reluzente e solidéu preto, o qual ainda trazia na mão um madeiro.
Talvez fosse o espetáculo mais inusitado que se pudesse ver
nos dias de hoje. Algo medieval. Tão estranho que não encontra paralelo em
qualquer outro evento que se consiga imaginar.
Já dentro do prédio, cujas portas foram abertas depois de
serem socadas com o madeiro, intercalavam-se músicas e momentos de silêncio, do
mais profundo silêncio. Os que portavam ramos ora ajoelhavam, ora levantavam.
Poucos foram os minutos que permaneceram sentados. Tudo coreografado como se o
maestro de capa reluzente e solidéu preto regesse uma orquestra com movimentos
imperceptíveis, mas mesmo assim obedecidos, reverente e prontamente seguidos.
De tudo, o mais interessante ainda estava por descobrir. A
razão daquilo. O que movia a todos ali era a história de um Deus que se fizera
homem para que os homens fossem como deuses. A história de um Deus que morrera
pelos homens para que eles recebessem o elixir da vida eterna. E que não havia
morrido de modo qualquer, mas de uma morte brutal que o deixara irreconhecível,
como um verme.
Notei também que todos ali criam não só na história que era
narrada, naquilo que o homem de capa reluzente e solidéu preto dizia. Criam que
o Deus morto ressuscitara e se apresentava numa fração de pão. Ele disse
que o faria a seus amigos há mais de dois mil anos, e até hoje esses amigos
daqueles primeiros amigos acreditam que isso realmente ocorra todos os dias, a
cada vez que se encontram.
É uma história inacreditável!
Perdi-me em meio a tudo. Em certo momento, a única coisa
que consegui fazer foi fixar meu olhar no sorriso de uma linda bebê que me fitava, marotamente, enquanto pulava no colo de sua mãe. Lembrei-me das minhas
filhas.
Envolto em meus pensamentos, em algum momento que não sei bem
qual foi, percebi que tudo era verdade. Eu tinha visto a Deus numa fração de
pão!
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