Ontem um amigo, que não é católico, perguntou-me por que
ainda não substituíra a foto que adorna a tela do computador da minha sala do
escritório, trocando a do Papa Bento XVI pela de Francisco. Indagou-me se eu
não apreciava o novo bispo de Roma, dizendo, completando sua pergunta, que
gostava dele. Disse-lhe, então, que não admirava Francisco justamente por conta
da simpatia que ele desperta em quem não é católico; e da aversão que causa nos
constrangidos e acabrunhados católicos de sempre.
Minha resposta não causou perplexidade, pois meu amigo me conhece
há anos e sabe o que penso. Mas poderia. Afinal, dentro do mundo moderno, um
católico não quereria que seu líder caísse nas graças do beautiful people?
Talvez outro católico quisesse ver Francisco na capa da Time. Eu, não. A mim, depõe contra
Francisco o fato de ele ser eleito uma das pessoas mais influentes do mundo por
aqueles que, se pudessem, destruiriam a Igreja.
E há uma explicação simples para o que penso. Só que não é minha.
Ei-la:
“Não é o servo maior do que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também
vos perseguirão a vós; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa.”[1]
No trecho acima do Evangelho de São João, Cristo deixa bem
clara a distinção que há, e que haverá até aos fins dos tempos, entre aqueles
que o perseguiram e os que escutaram sua palavra. Os primeiros, crucificaram-no
e crucificariam, caso pudessem, seus seguidores. Os outros, acolheram-no e
acolheriam-no, nem que fossem pregados à cruz.
Durante o caminhar da humanidade, com a encarnação do Verbo
de Deus, separaram-se então duas cidades: a dos homens que buscam a própria
glória, desprezando a de Deus; e a dos que buscam a glória de Deus,
desprezando-se a si mesmos[2].
E as duas cidades, a dos homens e a de Deus, mantiveram-se
apartadas uma da outra, principalmente porque a Cidade de Deus tinha como seu
sustentáculo a tradição oral e escrita, transmitida de geração a geração, que
remonta aos apóstolos de Jesus. A imutabilidade da tradição apostólica,
sintetizada no Credo Niceno-Constantinopolitano, era e é o manancial no qual há
de beber a Cidade de Deus; e é o que a distingue da sempre mutável Cidade dos
Homens. Esta, de seu turno, foi e sempre será uma babel imensa, por meio da
qual o homem quer porque quer ocupar o lugar de Deus, com doutrinas e teorias
para justificar tal ocupação.
Eis que surge, então, na Cidade de Deus, sábios mundanos que,
muitas vezes travestidos de humildes sacerdotes, inoculam em seu seio a impossível
missão de conciliá-la com a Cidade dos
Homens.
E o que a Cidade de Deus teria de fazer para que houvesse tal
aggiornamento?
Teria de deixar de ser a Cidade de Deus, a candeia que
ilumina os passos dos que escolheram a glória de Deus, para se tornar mais um
bairro obscuro da Cidade dos Homens.
Só que alguns da Cidade de Deus não relegaram os ensinamentos
apostólicos. E foram proscritos. A maioria da Cidade de Deus, porém, quer-se
ver no mundo como se mundana fosse, de manga de camisa, e não mais de batina. E isso se agrava ao ponto de hoje o mundo aplaudir, e fazê-lo de pé, aquele
que haveria de comandar a Cidade de Deus.
Volte-se ao trecho do Evangelho transcrito. Como Jesus foi
perseguido e levado ao madeiro, o mundo haveria de perseguir também aqueles que professam seu sagrado nome, como fez com o Papa Bento XVI. Eis, então, a pergunta: por que não persegue Francisco?
Não o persegue pois Francisco resolveu revolucionar a Cidade de Deus, para pintá-la definitivamente com as cores do relativismo moderno, levando a cabo a ideia de que a Igreja deve sujeitar-se ao mundo, e não sujeitá-lo
à glória de Deus.
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